A
Verdade na Universidade: por uma Universidade mais democrática e
popular
por Gabriel Landi Fazzio, diretor de Memória do Movimento Estudantil da UNE e militante da ParaTodos
No
último semestre, a juventude brasileira mostrou estar na linha de
frente da luta pela Memória, Verdade e Justiça em nosso país.
Tomando as ruas com seus escrachos e
protestos, não apenas fez frente às manifestações reacionárias
de setores midiáticos e militares que ladravam contra a Verdade e a
Memória: foi fundamental para acelerar o processo de instalação da
Comissão Nacional da Verdade. Tendo nascido anos após o fim do
período de autoritarismo, essa geração se move por entender o
quanto resta da Ditadura em nosso país ainda hoje: na desigualdade
estrutural de nossa sociedade, no silêncio conservador da mídia, na
arbitrariedade da Polícia Militar, na constante criminalização da
luta política.
Nas
Universidades não é tanto diferente. Para além de todos
obstáculos impostos cotidianamente, que dificultam aos estudantes
que se organizem e mobilizem, a própria estrutura de nossas
Universidades leva as marcas da Reforma Universitária autoritária
de 1968. Ainda que nos últimos anos o processo de expansão de
vagas nas Universidades Públicas tenha transformado sua composição
social, nosso modelo de ensino superior ainda é profundamente
tecnicista, mercadológico e profissionalizante. Com pouca ênfase na
pesquisa e na extensão universitária, o processo pedagógico
aplicado no Brasil hoje sobrecarrega o estudante de aulas expositivas
que pouco dialogam entre si ou abrem espaço à reflexão crítica. A
Universidade trata o ensino como um processo industrial, onde se
busca ejetar as universitárias e universitários o mais rápido
possível para o mercado de trabalho. Dentro desse paradigma
meritocrático e sufocante de ensino superior, questões como a
interdisciplinariedade, o debate político e a gestão democrática
do ensino são consideradas perda de tempo, um desvio de atenção do
real objetivo e papel da Universidade – a mera formação de mão
de obra qualificada.
Enquanto
movimento eminentemente jovem e crítico, o movimento estudantil deve
conseguir entender como aproveitar o momento histórico que vive o
Brasil para reabrir a luta por uma Universidade diferente, mais
democrática, popular e emancipatória. E, muito nesse sentido, deve
entender a quem vem a Comissão Nacional da Verdade.
Como
as Comissões da Verdade de diversos outros países, a nossa deverá
investigar os crimes cometidos pelos golpistas na implementação de
seu projeto elitista de país e recomendar reformas do aparelho
estatal brasileiro que visem torná-lo mais democrático. Tendo o
Estado brasileiro sido democratizado em um processo sem rupturas,
onde as rédeas da abertura política seguiram por anos nas mãos de
agentes da Ditadura, em muito das relações entre a Sociedade e
o Estado permanecem desvios autoritários. Um exemplo sempre muito
evidente é o da falta de participação dos movimentos sociais nas
tomadas de decisão dos Parlamentos e Governos, ou mesmo a repressão
policial a que estão constantemente submetidos. Incontáveis são as
greves que, no Brasil, são condenadas na Justiça como “ilegais”.
É
fundamental que, em nossa atuação no movimento estudantil,
lembremos que um dos motivos por trás do golpe militar de 1964 foi
interromper a luta da União Nacional dos Estudantes e dos movimentos
populares por uma Reforma Universitária que buscasse ampliar o
acesso à Universidade Pública, gratuita e transformadora, e
exigir que tal debate esteja na base da compreensão do significado
político da Ditadura Civil-Militar.
Para
tanto, é preciso que os e as estudantes debatam profundamente a
importância da Comissão da Verdade, do resgate da Memória e da
luta pela punição dos golpistas. Em diversos países do mundo,
estudantes universitários contribuíram (através de grupos de
pesquisa, estudos e debate) com os trabalhos das Comissões da
Verdade, apontando sentidos para suas investigações e ajudando a
divulgar para a sociedade os avanços obtidos por tais Comissões,
pressionando-as sempre que necessário.
Protagonista
no processo de luta que se desenrola a partir da nomeação da
Comissão da Verdade, a Juventude deve pautar seus rumos e
prioridades. Está
nas mãos desta geração levar adiante a busca interrompida por uma
Universidade Pública para todas e todos, capaz de formar crítica e
humanisticamente e de estar à serviço da construção de um Brasil
mais popular e igualitário.